A expressão zangada de Donald Trump, sentado na mesa reservada aos réus e ladeado por advogados, revelava o desconforto de quem está habituado ao comando e ao controle e não à submissão – no caso, ao juiz Juan Merchan, que supervisiona as 34 acusações criminais contra o primeiro ex-presidente americano a ser indiciado.
“Trump não está gostando nada disso”, resumiu a jornalista Maggie Haberman, do “New York Times”, autora da biografia “Confidence Man”. No tribunal de Manhattan, o ex-presidente se declarou inocente e ouviu do juiz um conselho, com tom de advertência, para limitar a retórica incendiária.
“Por favor, evite fazer declarações que possam incitar a violência ou agitação civil ou pôr em risco a segurança ou o bem-estar de quaisquer indivíduos. Além disso, por favor, não se envolva em palavras ou condutas que comprometam o estado de direito, particularmente no que se aplica a processos neste tribunal.”
O juiz Merchan descartou aplicar uma ordem de silêncio em Trump, que já chamou o promotor Alvin Bragg de racista, tirano e desonesto, e repetiu, em suas redes sociais, que o magistrado o odeia, questionando sua imparcialidade.
O lembrete para a contrição funcionou apenas no período de uma hora em que o ex-presidente esteve no tribunal. De volta a Mar-a-Lago, na Flórida, Trump retomou a posição de comando, jogou as palavras de Merchan ao vento e fez o oposto do que ele lhe recomendou.
Num evento de campanha orquestrado para tirar proveito do indiciamento, defendeu-se dirigindo sua artilharia contra o promotor, o juiz e a procuradora-geral de Nova York, Letitia James.
“Ele sabia que não havia caso e juntou essa acusação ridícula”, disse sobre Bragg. “Tenho um juiz que odeia Trump”, acrescentou, referindo-se a Merchan. “Ela é uma racista às avessas”, em uma alusão à procuradora-geral. O promotor especial Jack Smith, que lidera duas investigações sobre o papel do ex-presidente na invasão do Capitólio e na retenção de documentos confidenciais em sua propriedade, foi definido como “lunático”.
As acusações contra ele tornaram-se mais claras na explanação do promotor Bragg: Trump falsificou indevidamente registros comerciais para ocultar US$ 130 mil em pagamentos de reembolso ao advogado Michael Cohen, que comprara o silêncio da ex-atriz pornô Stormy Daniels.
“O esquema violou a lei eleitoral de Nova York , que torna crime conspirar para promover uma candidatura por meios ilegais”, disse o promotor distrital de Manhattan.
Por apenas uma hora desta terça-feira histórica, período em que ficou sob a custódia da corte de Manhattan, Trump deixou de ser Trump, embora se mostrasse inadequado na roupagem de submissão e obediência e a ponto de explodir diante daqueles que nomeou como seus mais novos adversários de campanha.
g1 PB
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